segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

A História do Graffiti

Uma proposta que se auxilia de questões atuais e arrojadas, que movem o mundo dos jovens, formando opiniões, pensamentos e atos de expressão, que desencadeiam uma série de produções participativas no cotidiano social, não só pelas formas e cores vibrantes, como pelo viés da crítica social.

Este conteúdo pode ser desenvolvido tanto no Ensino Fundamental 2, quanto no Ensino Médio, onde a adolescência vem carregada de perguntas e desafios.

A HISTÓRIA DO GRAFFITI

Introdução


Quando arqueólogos descobriram palavras e desenhos inscritos em cavernas, rochas e monumentos antigos, usaram a palavra graffiti para designar os rabiscos que provavam a existência de muitas civilizações primitivas e a sobrevivência de linguagens e cultos. O grafite serviu para datar ruínas e fornecer indícios sobre a vida cotidiana em determinadas épocas (como os grafites de gladiadores em Pompéia). Além disso, sob a forma de riscos qualquer, feito a carvão, era usado para adulterar figuras, estátuas e monumentos.
Um das grafites mais famoso do mundo, segundo alguns estudiosos, é a caricatura de Cristo crucificado da parede da Domus Gelotiana, no Paladino, em Roma, que foi descoberto no século dezenove.
Além da comunicação pictográfica formal, sempre existiu comunicação informal ou alternativa, como atualmente se diz. A comunicação para o público em forma escrita em qualquer suporte (muro, pedra, madeira, etc.) geralmente manifestava idéias ou atividades da camada predominante de uma comunidade. Desta forma obedecia aos conceitos tidos como verdadeiros e devia pautar-se por padrões condizentes, morais e lingüisticamente, com a sociedade. Mas em qualquer sociedade há indivíduos que não concordam com essas normas ou que não as aceitam em tudo ou em parte e, às vezes, manifestam-se contra elas por diversos meios. No caso da manifestação escrita, alguns não o fazem por não ter o suficiente conhecimento das normas vigentes ou por assim se considerarem e, outras vezes, por temor à reação que suas idéias podem desencadear. Assim, muitas vezes se escondem no anonimato, mas não faltam casos em que mostram sua rebeldia (com ou sem causa) com a intenção de agredir, manifestando-se contra tudo e contra todos.
Essa escrita (não-oficial, alternativa, marginal, contestatória, de protesto ou como mais se queira chamar) existe desde que o homem dispõe de algum tipo de comunicação visual (gravuras, pinturas, símbolos pictóricos, ideogramas) e, principalmente, com a representação escrita da linguagem humana, portanto, os grafitos de Pompéia não são as primeiras manifestações de escrita alternativa. Eles revestem-se de importância para ajudar a conhecer aspectos de sociedade não conservados na literatura nem em documentos convencionais. Podemos verificar que essa prática era comum antes e depois do soterramento de Pompéia e localidades circunvizinhas, chegando a nossos dias com nomes e pretextos diversos, mas pelas mesmas causas e por autores semelhantes.
Atualmente, com o nome de pichadores (de piche) deixam suas mensagens com material bem mais daninho que o carvão usado pelos grafiteiros, que só foi preservado pela lava do Vesúvio.








Importância dos Grafitos de Pompéia


Os graffiti (grafitos em italiano e assim dados a conhecer) têm grande importância para a história da sociedade romana do século I, mas para a Filologia estas inscrições foram importantes porque contribuíram para o conhecimento do latim vulgar. Sabemos que se preservaram muitos documentos do latim, o que permitiu que se conhecesse relativamente bem esta língua, devido à contribuição dos grandes escritores e de outros textos não-literários, porém estes textos eram escritos em latim culto (clássico), o que tem permitido que o latim se possa estudar até nos dias de hoje.
No latim clássico, mas no latim vulgar ou corrente (língua falada em toda a România, mas com variantes em cada região). Esta língua era a falada ou vulgar, mas ao escrever usava-se, ou pretendia-se usar, a língua clássica, por isso quase não há nada escrito nessa língua falada. Para ter idéia de como seria, procuraram-se meios diretos ou indiretos: as chamadas fontes do latim vulgar. Nessas fontes destacam-se as inscrições que se conservaram em diversos suportes (pedra, chapas de metal, paredes, mosaicos, etc.).
Os grafitos de Pompéia, Herculano e Estábias são rabiscos nos muros dessas cidades que, de alguma forma, retratam a vida cotidiana dos cidadãos romanos do primeiro século de nossa era.
A escrita que se pôde e ainda se pode resgatar da época da erupção do Vesúvio tinha como suporte os muros da cidade assim como grandes mosaicos, nos que também se representavam figuras diversas. Havia casas decoradas com mosaicos com figuras e texto nas paredes, no teto e até nas calçadas.
As paredes da parte nobre da cidade (Fórum) funcionavam como jornais murais para informar a comunidade. Estavam cobertas de grafitos com temas diversos: slogans eleitorais, comerciais e anúncios dos próximos eventos no anfiteatro. Sabe-se que as línguas românicas, também chamadas neolatinas ou novilatinas (português, espanhol, francês, italiano, romeno, catalão, sardo e outras)
A Cidade de Pompéia tinha oito portões de entrada, 11 elevatórias de água, fórum, teatro ao ar livre para 5.000 pessoas para apresentações dramáticas; um teatro coberto, (Odeon) para música e poesia; um anfiteatro para 20.000 espectadores sentados, para realização de jogos e combates de gladiadores; três banhos públicos com calefação por ar aquecido; toaletes públicas e piscinas. Desempenhavam o papel de centros sociais. Depois da siesta*(1), os moradores podiam ir a esses banhos públicos. Dos 20.000 moradores de Pompéia, 8.000 eram escravos, os quais faziam algum trabalho manual ou trabalhavam como tutores, contadores, etc.
Na erupção do vulcão, calcula-se que pereceram 2.000 pessoas.
O fórum era rodeado por numerosos templos e edifícios administrativos. Existem naquela área as ruínas dos templos de Vênus, Apolo, Vespasiano, Júpiter; os dos deuses do lar, a basílica (destinada à Administração pública e à Economia) e o mercado. Era a área de maior atividade da vida pública da cidade. Noutras partes da cidade encontravam-se as casas e palácios particulares, muitos dos quais interessantes por sua riqueza arquitetônica e artística. Ocupavam grande espaço e tinham no seu interior um átrio e grandes jardins. Nas paredes havia afrescos, geralmente influenciados pela cultura e arte gregas. Entre estas casas destaca-se a do Poeta trágico, com um mosaico com figura e a legenda Cave cane (Cuidado com o cachorro), a Vila dos Mistérios, com ricos afrescos, a Casa do Fauno, com uma estatueta de um Fauno dançante e muitas outras.
As ruas da cidade tinham de 2,5 a 7 metros de largura e estavam pavimentadas com blocos de lava do Vesúvio. As calçadas eram altas e, nos cruzamentos, havia blocos altos de pedra no meio da rua para atravessar. Não havia sistema de esgotos e o lixo ficava no meio da rua para ser carregado pela chuva.
A maioria das pessoas morava em pequenos apartamentos em cima das lojas. Não tinham fogão nem água. As pessoas podiam comprar as refeições quentes nas lojas de alimentos e obter água potável nas fontes públicas dos cruzamentos das ruas.
Pompéia tinha um aqueduto que trazia água dos morros próximos. Os canos passavam por baixo das calçadas para as casas dos ricos, os banhos públicos e os chafarizes. Uma elevatória de água com um tanque de chumbo em cima estava próxima a cada chafariz existente em cada cruzamento de ruas.



Os Pichadores


O homem desenhava nas paredes já no tempo das cavernas. Desde então se tentou comunicar com os recursos de que dispunha. Ao conhecer a escrita, passou a usá-la para transmitir suas mensagens, valendo-se dos suportes e instrumentos que lhe eram acessíveis. Detivemo-nos em Pompéia, já no início da era cristã, onde por um golpe do destino, foi-nos permitido o acesso a comunicações escritas nas paredes ou em mosaicos. Essas comunicações podiam ter finalidade comercial e por isso tinham lugares conhecidos para serem exibidas para que as lesse a maior quantidade de pessoas possível.
As mensagens eram geralmente escritas a carvão ou material de curta duração para as paredes poderem ser reaproveitadas, como ainda ocorre hoje com o quadro-negro. Freqüentemente, também se pintavam figuras e, às vezes, seus autores informavam seus nomes.
Paralelamente a estas informações convencionais, outros autores, anônimos ou não, rabiscavam suas mensagens com finalidades diversas: deixar constância de sua presença no lugar, expor suas idéias, fazer críticas a alguém, fazer denúncias, comentários jocosos geralmente de natureza sexual, etc. São estes escritos, já na época conhecidos como graffiti,
os que despertam mais curiosidade nos estudiosos porque, de certa forma, retratam melhor a realidade, mascarada pela linguagem e hábitos da sociedade convencional. Esta escrita alternativa costuma ser espontânea, sem concessões aos eufemismos, ocultando-se muitas vezes o autor no anonimato, daí, no caso do latim, assim como inscrições de vários tipos em todo o mundo românico, conter elementos lingüísticos do latim falado ou vulgar, bastante diferente do usado pelos intelectuais do Império.
Acredita-se que as pichações que atualmente sujam e danificam as grandes cidades do mundo ocidental tenham origem na Nova Iorque de há mais de trinta anos, quando começaram a aparecer em transportes públicos e edifícios rabiscos, muitas vezes ilegíveis, com os quais diversas gangues marcavam seu território e usavam esses suportes para manifestar suas opiniões por meio de mensagens políticas, humorísticas, sexuais ou, mais comumente, sua total falta de idéias.
No século XX, mais precisamente no final da década de 60, jovens do Bronx, bairro de Nova Iorque (EUA), restabeleceram esta forma de arte usando tintas spray. Para muitos, a grafite surgiu de forma paralela ao hip hop - cultura de periferia, originária dos guetos americanos, que une o RAP (música muito mais falada do que cantada), o "break" (dança robotizada) e a grafite (arte plástica do movimento cultural). Nesse período, academias e escolas de arte começaram a entrar em crise e jovens artistas passaram a se interessar por novas linguagens. Com isso, teve início um movimento que dava crédito às manifestações artísticas fora dos espaços fechados e acadêmicos. A rua passou a ser o cenário perfeito para as pessoas manifestarem sua arte.
A grafite nasceu marginal, nas paredes do metrô de Nova York, e chegou à condição de arte. Arte contestadora é verdade, mas é arte e por isso mesmo diferente de "pichação".
A grafite invadiu os muros e chegou às galerias de arte.
Escrita ou desenho? Ato de vandalismo ou manifestação artística? Para muitos, a grafite é apenas uma "pichação evoluída". Para outros, uma modalidade de arte urbana.

A escrita das ruas no Rio de Janeiro: a pichação e o grafite


À semelhança do que acontece em outras metrópoles, muros e fachadas do Rio de Janeiro cobrem-se de mensagens que não têm outro espaço de expressão. Alguns dizem que é arte; outros, que é vandalismo. Fato é que o espaço urbano cobre-se de inscrições, que registram parte dos anseios de nossos tempos.
A história da escrita das ruas é marcada pelo signo da transgressão. Ocupar muros e fachadas com inscrições de caráter político ajudou opressores a reforçarem seu poder, assim como foi expressão da resistência dos oprimidos. É esse caráter de resistência o responsável pela fixação do perfil dos pichadores: era preciso escrever mensagens curtas, porém carregadas de sentido; era preciso fazê-lo rápido para não ser surpreendido pela polícia; era preciso agir à noite; era preciso escolher um lugar visível pelos leitores; era preciso ter coragem.
Inicialmente, o material usado para escrever foi o piche, ou breu, uma substância resinosa, de cor preta e muito pegajosa, obtida a partir da destilação do alcatrão ou da terebintina, de onde vem o nome 'pichação'. O piche foi logo substituído pelas tintas industrializadas, aplicadas com rolo ou pincel e, finalmente, pelas tintas em spray. A história da escrita das ruas é marcada pelo signo da transgressão.
Os muros antigos do Rio de Janeiro guardam, próxima ao reboco original, a história dessas mensagens, que se renova hoje através de outros sujeitos. Hoje a escrita das ruas não
brada por democracia como regime de governo, mas por espaço de expressão, por igualdade social, por distribuição de renda, por moralidade na política, muitas vezes dizendo simplesmente: "existo, estou aqui", e perguntando: "o que querem fazer comigo?".
Dizer que a pichação e o grafite que revestem, hoje, desde os prédios históricos aos monumentos, fachadas de prédios privados e muros do Rio de Janeiro é simples vandalismo ou exibicionismo é mais que desconhecer a história da escrita das ruas, é negar que ainda temos necessidade de liberdade e igualdade de expressão. Conforme Baitello Jr.(6) (1994), compreender o grafite significa "compreender o exercício de autonomia dos componentes de uma sociedade, dos habitantes de uma cidade. Mais ainda, significa compreender a transgressão como aquele momento do mais lícito exercício de liberdade".
A pichação, tal como se conhece hoje, No Rio de Janeiro, foi inaugurada na década de 70, quando Toniolo (7) passou a anotar seu nome nos espaços públicos da cidade. O tag (8) Toniolo já foi confundido com marca e com produto. O autor tornou-se ídolo das novas gerações de pichadores, que muitas vezes o homenageiam, sem conhecê-lo, reproduzindo o nome dele para declararem que se identificam com a vocação que ele tem para a transgressão.
O tag teria se originado em Nova Iorque, em meados da década de 50, com jovens norte-americanos que começaram a escrever seus nomes nas paredes com a mesma tinta com a qual se pintavam os automóveis. Em seguida, como uma espécie de efeito do nomadismo dos grupos que interpenetravam os espaços negados a eles, as inscrições estenderam-se para fora dos guetos, pelos metrôs, parques, prédios. Em outro sentido, também ali a escrita das ruas apresentava-se como uma forma de resistência, através da qual os sujeitos se faziam reconhecer como aqueles a quem os direitos estavam sendo negados.
Atualmente, além de tag, os espaços do Rio de Janeiro portam outros tipos de inscrições. Ali se encontram os grafismos, as criações, ou recriações, de alfabetos, possivelmente experimentos, cuja motivação buscamos conhecer.
Os grafismos estão presentes inclusive à grande altura nas fachadas de prédios e se dividem em dois tipos. O primeiro inspira-se em trabalhos norte-americanos, de grafiteiros ligados ao hip-hop. Caracteriza-se pelas formas arredondadas, dentro de cujo contorno o preenchimento é feito com tinta aplicada com rolo. O segundo tipo caracteriza-se pelas formas alongadas, angulosas, grafadas com tinta spray. Estes se constituem na produção autenticamente brasileira de grafismo e tornaram-se produtos de exportação, admirado fora do país e apropriado comercialmente por fabricantes de pranchas de surf e skate.
Tal como o tag, o grafismo atesta o comparecimento de um sujeito a um certo lugar, do qual ele, pela produção, apropria-se. Mais que o tag, entretanto, o grafismo choca a sociedade, mas isso é apenas um efeito secundário perseguido pelos autores, em cujos depoimentos aparecem justificativas baseadas em 'coragem, ousadia, desafio ao perigo e adrenalina'.
O uso do termo 'pichação', hoje, é restrito entre os escritores de rua, que não se consideram 'pichadores'. A pichação é aquilo que resulta do 'picho reto', expressão de caráter um tanto pejorativo que designa as mensagens meramente lingüísticas, cujo sentido crítico pode ser depreendido linearmente. Tais intervenções normalmente têm marcado caráter ideológico e são muito comuns durante os períodos eleitorais. Apesar de as mensagens em 'picho reto' serem as que se situam mais perto daquelas que caracterizaram os períodos de revolução no Brasil e no mundo, são as menos abundantes no Rio de Janeiro, e não são de responsabilidade dos grafiteiros.
Ao lado da pichação, do tag e dos grafismos, encontramos o estêncil e o grafite-arte. Estes últimos são considerados mais nobres, em função da necessidade de domínio de técnica e também por causa do seu resultado estético. É preciso dizer, também, que produzir obras em estêncil e grafite-arte requer mais dinheiro. São necessários mais materiais cujo custo final é mais alto. Disso se depreende que o estêncil e o grafite-arte só são populares no que tange à democratização do produto final.
O estêncil consiste na aplicação de tinta sobre uma máscara de acetato vazada: na maioria das vezes é produzido com radiografias. Requer que um desenho seja produzido em papel, transferido para o acetato que, então, é cortado com estilete para criar a base da imagem que vai se revelar quando a máscara é colocada sobre uma superfície e os espaços vazados são preenchidos por tinta. Embora sua impressão sobre as superfícies de rua seja, dependendo do número de cores que use, muito rápida, as etapas que antecedem a aplicação são muitas, demoradas e requerem materiais especiais. Por isso, uma intervenção em estêncil nunca é improvisada, ao contrário, é planejada, elaborada de modo a resultar em uma expressão artística.
O grafite-arte é dado como a mais rica forma de intervenção de rua, do ponto de vista estético e técnico. Além de formas e cores, muitas vezes apresenta texturas. Ocupa espaços maiores: muros inteiros e fachadas, mas também se instala em suportes menos nobres: containeres, tapumes, pedras, móveis abandonados, carcaças de automóveis etc. Tanto quanto o estêncil, o grafite-arte requer planejamento prévio. A base do trabalho normalmente é feita com tinta acrílica, usando-se rolo. Sobre ela, formas e cores vão, então, sendo impressas, de acordo com um esboço prévio.
Dificilmente um espaço público contém a obra de um único sujeito. Grandes espaços são compartilhados por membros de grupos de grafiteiros; eventualmente, por mais de um grupo. Além disso, as obras podem ser coletivas. A produção do grafite-arte permite ao autor a citação metalingüística, a intertextualidade, as paráfrases e a criação. É através do grafite-arte que o grafiteiro se faz muralista, artista.
Ainda assim, raramente o grafiteiro assina sua obra com o nome de batismo ou o nome de família. Grafiteiro tem apelido ou pseudônimo. Muitos identificam sua produção com um tag, enquanto outros não assumem uma identidade particular, identificam a obra com o nome do grupo a que pertencem. De qualquer modo, a identidade que escolhem serve ao propósito de marcar a diferença entre quem grafita e os que criticam, repudiam ou apreciam essa manifestação.
A moda do graffiti (pichação) logo se espalhou por todo o mundo ocidental, e no Brasil pegou talvez da pior maneira possível.
A presença de casais de namorados em determinados lugares tem sido tradicionalmente motivo para gravar seu nome à ponta de canivete em árvores ou em outros suportes perduráveis, porém esta prática pouco mal pode causar. Os rabiscos em banheiros públicos (as famosas latrinárias) também já se tornaram um hábito, servindo até de tema para trabalhos de pesquisa acadêmica de ordem psicológica.
De essas e outras manifestações alternativas de comunicação ou manifestação do ego, a realmente prejudicial é a pichação. Se fossem escritas a carvão, como faziam os colegas pompeanos, pouco dano causariam porque são fáceis de apagar, mas dentre a imensa gama de material de escrita de que se dispõe na atualidade, os pichadores escolhem o spray para deleite de fabricantes e comerciantes de tintas e desespero de donos de imóveis, que não sabem mais o que fazer para evitar a pichação de suas propriedades.
Não se trata de falta de local para escrever suas mensagens nem exibir sua "arte". Parece haver apenas disputa de gangues locais competindo para causar o maior dano possível. Os rabiscos quase sempre indecifráveis e os grosseiros erros de ortografia nas poucas palavras legíveis dão bem idéia dos ideais artísticos destes "grafiteiros". É claro que também se pode manifestar arte ou transmitir mensagens escritas em paredes, muros ou suportes semelhantes, mas para isso são liberados espaços onde surgem verdadeiros artistas. Estes merecem que se lhes conceda espaço e até ajuda para desenvolver sua capacidade. Para os outros, os do spray, punição severa, que não precisa ser cadeia, mesmo porque dariam ainda mais prejuízo à sociedade, que tanto desprezam. Basta que se punam com a limpeza das paredes emporcalhadas (com perdão dos suínos) com suas pichações. Nada mais justo. Vassoura e balde d´água na mão à vista de seus colegas e do público em geral serviria como desestímulo para todos os que picham no lugar mais alto e visível que podem e para os que pretendem enveredar por esse caminho.

AOS PIXADORES, ÁGUA E SABÃO


Opiniões de quatro pessoas ligadas às artes que observaram, analisaram e discutiram o grafite.
"O grafite revela uma forma viva, inquieta e provocativa de participação e comunicação. Às vezes é um relato, uma fantasia não realizada, um depoimento sofrido ou debochado, talvez de quem sente necessidade de se expressar.Como forma de comunicação, parece-me que o grafite é uma das expressões mais simples e fáceis, Ele existe tanto na Europa, nos Estados Unidos, como no Brasil. A diferenciá-lo apenas, mas fundamentalmente, a cultura de cada povo. Aí, observa-se que as fontes de preocupações traduzidas por meio do grafite são muito diferentes, até mesmo na forma de executá-lo. E é, quase sempre, a forma de execução que me desagrada.
Observada a propriedade no aspecto físico, acho lindo e gosto muito. Gosto da coisa brincalhona, da denúncia contundente, do lirismo. Não gosto, e creio extremamente negativo, é quando o grafite é poluição, sujeira (grafite sobre grafite, grafite sobre cartazes, lugares inadequados...). Acho péssimo, por exemplo, ver a sinalização - que é belíssima - da nossa cidade totalmente grafitada, os viadutos "borroscados", enfim...
Na verdade, eu não gosto da coisa assim, suja. É possível, no entanto, que ao preferi-la mais arrumada eu esteja desejando uma arte que por si só é anárquica e objetiva a provocação, de uma ou outra forma. De repente é ruim e até errado acreditar que manter limpo o patrimônio de uma cidade é mantê-la civilizada..."
(Wadel Clarimundo Gonçalves, professor, comunicólogo e ator de teatro).
"As pichações de 77 e 78 (foi o auge) refletiam a tensão psíquica que a cidade vivia. Eram pichações impessoais, muito mais criativas e mais graciosas e menos violentas. Depois que as pichações surgiram como tema de abertura da novela O amor é nosso, em padrão global, foram automaticamente incorporadas pelo sistema, virou mídia, perdendo o fascínio e a espontaneidade. As pessoas começaram a usar a pichação como propaganda, com fim determinado (que o verdadeiro grafite não tem). As pichações de antigamente eram mais saudáveis (Sexoral é bom, Sabor de veneno, Vamos nessa Vanessa, Ouvir a vaia do vento, Ora, Aurora etc). Hoje elas são muito agressivas e personalizadas, parece que a crise de identidade aumentou, todo mundo quer ver seu nome 'impresso'".
Além do mais, entra a questão da poluição, não só visual, como ambiental. Constatou-se nos últimos anos que a camada de ozônio (uma espécie de oxigênio concentrado que fica em uma das últimas camadas da estratosfera), é afetada pelo uso de aerossóis. Estes, em forma de spray, liberam, entre outros elementos, o cloro, que pode quebrar as moléculas de oxigênio dessa camada. Sem o ozônio a vida na terra seria impossível, pois ele filtra os raios ultravioletas, protegendo o planeta. Uma forma ecológica de pichar é usar carvão, gizão de cera, pois ainda não se inventou um spray sem propelente. Em todo caso,leia atentamente o rótulo".
(Nicolas Behr, poeta e ambientalista)
"O grafite é um estado de espírito; para colocá-lo para fora, um estado de explosão. Impossível analisá-lo sem o risco da galhofa ou do excesso de autoritarismo. O grafite é arte. Cada um sente aquilo que vê. E pronto. Pietro Maria Bardi escreveu "merda" - e foi definitivo.
Pessoalmente, acho que falta imaginação, e muita, nos grafites brasilienses. Talvez por ser a cidade que somos. Talvez por termos a origem que temos, nossos grafites são pobres. São copiados e, não raro, apelativos. Os homens que definem nossas vidas estão aí, ao lado de habitações tipo BNH, os políticos; esta é uma cidade cultural, política e administrativa. Tudo poderia gerar bons grafites e, por certo, não haveria sabão e detergente para limpar todos. O grafite é a alma - oculta - de uma cidade. Brasília, que eu adoro, precisa mostrar sua consciência grafítica. Pego meu spray/ E faço no muro branco/ Minha Guernica/ Sob todas as condições e pressões/ Ditadas pela criatividade freudiana:/ Qüid me vis facere, Domine?
(José Carlos de Souza, jornalista e publicitário).
"O grafite prova que não tem quem segure a boca de quem quer falar. Que não existem obstáculos para o se expressar. Se você não tem grana para publicar livros ou comprar tintas e papéis maravilhosos, o que acontece é de sair por aí com tinta de parede mesmo ou spray, lançando seus recados. Acho maravilhoso.
O grafite atual deve ter nascido do arrocho, da pobreza, em algum bairro nova-iorquino, imagino. Aliás, tem grafites e grafites. Tem uns ótimos, cheios de humor, que você até olha distraído e acaba soltando risada. Há os muito gráficos, grafites cheios de grafismo, e os políticos, tipo mandando recadinhos, marcando encontros, reivindicando.
Agora, é preciso que se tenha semancol. A responsabilidade do grafiteiro é grande, ele atinge multidões todos os dias. Queimar espaço branco quase sempre pra falar besteira não está com nada.
Em Nova Iorque, teve um ano em que o prefeito de lá liberou o metrô e os trens para serem decorados pela população. Distribuiu spray de graça pra quem quisesse e o resultado foi um lixo geral. Foram usados litros de tinta para borrocar tudo, que chegou ao vandalismo. O que eles passaram de emoção foi uma sujeira, um negócio muito down.
Brasília é uma das poucas cidades que existem que não tem prédios altos nem fábricas poluindo o ar; é uma cidade muito clara, branca, com um visual que descansa a cabeça das pessoas. Acho que o grafite só deve ser utilizado por quem tem alguma coisa importante pra dizer, uma necessidade interior muito grande mesmo de se expressar. Há uma diferença enorme entre pichação e grafite. O grafite é uma coisa artística, algo como eu vi também em Nova Iorque: escrever poesia com giz, no chão, onde todo mundo vai passar em cima e apagar, mas onde muita gente também vai parar e ler o poema."



Referências Bibliográficas


FUNARI, Pedro Paulo - Cultura Popular na Antigüidade Clássica. Grafites e arte, erotismo, sensualidade e amor, poesia e cultura. São Paulo, Contexto, 1989.
- GOLDBERG, Rose Lee - Performance Art, from futurism to the present. Yoguslavia, World of Art, 1979.
- HENRI, Adrian - Environments, Happenings and Performance. N. York, Paeger Publ., 1974.
- Henry, Chalfant & James Prigoff- Spraycan Art London, Thames and Hudson, 1987.
- HUBER, Joerg - Paris Graffiti. Londres, Thames and Hudson, 1986.
- KUZDAS, Heinz J. - Berliner Mauer Kunst. Berlim, Elefanten Press, 1990.
- LARA, Arthur H.. - Arte Urbana em Movimento. Dissertação de Mestrado, Depto. de Comunicações e Artes, ECA USP 1996.
- RAMOS,CÉLIA MARIA ANTONACCI- GRAFITE PICHAÇÃO & CIA São Paulo Annablume, Selo Uuniversidade, 1994.
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- SILVA NETO, Serafim. História do latim vulgar. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1957.


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